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Transformação no Mundo do Trabalho

Escrito po: Postado por Clara Bisquola

24/08/2010


Texto apresentado no Seminário Nacional sobre Profissões da Saúde: Interdisciplinaridade e Necessidades Sociais do SUS em Brasília, 18 e 19 de agosto de 2010 – Autor Waltovânio C. Vasconcelos – MNNP-SUS

Falar sobre a Transformação no Mundo do Trabalho, mais especificamente no ramo da Seguridade Social e no Setor Saúde, é ao mesmo tempo uma tarefa difícil para nós, trabalhadores da saúde que do ponto de vista da formulação teórica, a grande maioria, ainda tem dificuldade de acesso a uma metodologia apropriada, seja pela labuta do dia a dia ou por não conseguir freqüentar um curso de educação continuada ou pós graduação. Tarefa que num evento como esse, deixo para os pesquisadores que já estão bem representados nessa Mesa e pelo que foi falado com muita propriedade hoje pela manhã pela Dra. Maria Helena.

Por outro lado, torna-se fácil, pois grande parte de nós estamos vivenciado e estamos participando dessas transformações nos últimos 50 anos (que o diga o nosso colega de trabalho o Dr. Olímpio), ou 40, 30 e mais especificamente os últimos 20 anos com o advento do SUS.

Falar nesse momento da construção da previdência social no Brasil, da consolidação das Leis Trabalhista por Getúlio, da criação do Ministério da Saúde, da luta histórica dos trabalhadores pelos direitos sociais e pela sua manutenção, do “desenvolvimentismo” de JK, do “nacionalismo” da época dos militares e a sua relação com os direitos trabalhistas e de greve, das primeiras conferências nacionais da saúde, do movimento sanitário, da luta na constituinte pela criação do SUS, da implantação da NOB de recursos humano, a implementação de políticas neoliberais e adesão ao Consenso de Washington, a desregulamentação do mercado de trabalho e a necessidade de politização do debate sobre o SUS, talvez já seja redundância nesse momento.

Entretanto, quero pautar a fala dos trabalhadores que representam a bancada sindical na Mesa Nacional de Negociação Permanente do SUS à partir da sua reestruturação, em 2003, pelo Presidente Lula, e do convívio que tivemos à partir daí na formulação e discussão de políticas de gestão do trabalho e educação em saúde para o SUS.

Precarização do Trabalho no SUS:

O momento de criação e implantação do SUS dá-se justamente no período de crise econômica mundial, refletida no Brasil com declínio da atividade industrial, inflação galopante, baixo nível de profissionalização da força de trabalho, e se traduz numa lentidão na regulamentação e implementação do SUS e principalmente pelos baixos recursos destinados à saúde no Brasil, atitude que será absorvida e seguida por todos os governos posteriores.

O avanço significativo do neoliberalismo, principalmente à partir da década de 90, com a implantação do Estado Mínimo, com o fim de redefinir o papel do Estado na economia, tem como conseqüências o desemprego, o aumento do trabalho informal, a flexibilização dos direitos trabalhistas, dentre outros, que reflete no processo de implementação do SUS.

Surgem, portanto, estranhas modalidades de contratação pelo SUS e que obriga a convivência de trabalhadores com diferentes vínculos empregatícios num mesmo local de trabalho com salários e benefícios diferentes para o desempenho, muitas vezes, da mesma função.

Desta forma temos, o regime estatutário, previsto na Constituição Federal para o Servidor Público, o celetista por emprego público, trabalhadores sem contratos (ou com garantias verbais de políticos), o RPA (trabalhador autônomo), contratos temporários em regime celetista, terceirização, contratos por cooperativas, Oscips/OS/ONG’s, fundações estatais, dentre outras modalidades.

Algumas dessas modalidades de contratações não têm respondido às necessidades do SUS uma vez que têm gerado a precarização do trabalho para os trabalhadores da saúde e muitas vezes uma desresponsabilização pelas ações de saúde, à partir das terceirizações.

Para os trabalhadores o conceito de precarização do trabalho engloba, não somente a falta de condições para o exercício profissional, como infra-estrutura e ambiente adequados, uma boa saúde, como também aquele caracterizado como déficit ou ausência de direitos da proteção social e aquele decorrente de uma instabilidade de vínculo, como a ausência de concurso público para gerar a estabilidade no regime estatutário.

Propor algumas panacéias que viram histórias no SUS e na administração pública em geral, como as OS e Oscips, e agora as Fundações Estatais, como forma de encobrir os problemas de gestão e, muitas vezes o mau gerenciamento da coisa pública, e com o fim de facilitar, à curto prazo, o manuseio da máquina administrativa, sem antes aprofundar com ousadia o cumprimento das diretrizes do SUS e de preceitos constitucionais para a Administração Pública é perder a chance de implantar efetivamente o SUS e aprofundar esse modelo de precarização que vem se arrastando desde o século passado.

Por que os trabalhadores públicos admitem o ingresso no SUS através do concurso público? Porque é a forma constitucional, legal, e que dá segurança adequada tanto para o trabalhador quanto para o usuário do serviço público, em que ambos não terão a interrupção do trabalho ou serviço prestado, por exemplo, por ocasião das alternâncias de poder, quando podem ficar totalmente a mercê dos humores do novo gestor público. Isso é segurança! É estar imune, de certa forma, às “vinganças” políticas, no campo ideológico.

Necessário se faz, aprofundar as medidas de desprecarização do trabalho no SUS já reconhecida e sobejamente discutidas em todos os eventos públicos da área e reativar os trabalhos do Comitê Nacional e Interinstitucional de Desprecarização do Trabalho no SUS.

São vários os companheiros, trabalhadores e trabalhadoras, que nos cobram um posicionamento em relação ao seu vínculo precário e, principalmente, as garantias de sua aposentadoria. Exemplo que se dá é o caso dos trabalhadores do Hospital Público Orestes Diniz da Rede Fhemig na Colônia Santa Isabel, em Betim-MG, que há quase 20 anos têm contrato temporário de trabalho, isso mesmo, temporários há quase 20 anos!

Plano de Cargos Carreiras e Salários:

Além disso, são muitos municípios e Estados da União em que os trabalhadores do SUS ainda não têm um Plano de Cargos Carreira e Salários, que lhe garanta a valorização do trabalho e o seu desenvolvimento profissional, numa perspectiva de carreira e segurança até a aposentadoria.

A implantação do PCCS é uma necessidade para o fortalecimento da política de gestão do trabalho no SUS, já reconhecidas e deliberadas inúmeras vezes nas últimas Conferências de Saúde e de Gestão do Trabalho e Educação em Saúde, em todas as esferas de governo, aprovada na Norma Operacional Básica de Recursos Humanos e estabelecida no Pacto pela Vida e de Gestão.

A instituição das Diretrizes Nacionais do PCCS, à partir de um trabalho conjunto dos trabalhadores e gestores na Mesa Nacional e homologadas pelo Conselho Nacional de Saúde, já é um grande avanço para a política de Gestão do Trabalho no SUS, mas que ainda não foram implantadas efetivamente.

A falta de uma carreira para o SUS, os baixos salários, o difícil acesso a Unidades de Saúde, a violência urbana, dentre outros fatores, têm dificultado a fixação de trabalhadores de saúde em municípios seja por dificuldades de contratação pela região não ser atrativa para os profissionais, seja decorrente de dificuldades financeiras, é um problema a ser resolvido pelo SUS à fim de garantir e facilitar o acesso da população a serviços de saúde básicos, que hoje estão interrompidos.

A instituição da carreira nacional é uma possibilidade que já vem sendo discutida há alguns anos em vários fóruns de gestores e trabalhadores, e por ser uma política importante de Estado e estratégica para o SUS, precisa de uma discussão mais aprofundada com o conjunto dos trabalhadores, através de suas entidades sindicais, e não restrita apenas a algumas categorias profissionais de nível superior.

Acredito que o movimento sindical do trabalhador da saúde já é suficientemente maduro e sabe quais são as verdadeiras necessidade do SUS com respeito a gestão do trabalho e, nesse aspecto, não correremos o risco de falhar como aconteceu com as outras 4 tentativas de interiorização de médicos no Brasil.

Esse processo deve se dá perfeitamente na própria Mesa Nacional de Negociação Permanente do SUS, como aconteceu há 4 anos com as diretrizes nacionais do PCCS, e agora com a Comissão Nacional de Saúde do Trabalhador. Portanto, é necessário mudar o local da discussão.

Uma boa parte de trabalhadores de nível médio hoje já possui curso de graduação, na mesma carreira, e não tem a mínima possibilidade de ascensão profissional. Todos nós sabemos das dificuldades jurídicas para essa situação, mas é uma realidade que bate a porta de nossas unidades de saúde todos os dias e um grande problema para o gestor público, pois corre o risco de perder esse profissional já treinado e qualificado para o trabalho por falta de perspectiva profissional.

Portanto, hoje é necessário propor uma saída jurídica para essa dificuldade de ascensão profissional na carreira para os trabalhadores do SUS, que tem o seu lado bom, por ser fruto da política de valorização do jovem e a facilidade de acesso a universidade promovida pelo governo Lula, além dos esforços pessoais e principalmente financeiros do próprio trabalhador.

Formação Profissional:

Se por um lado a expansão do ensino superior com a abertura de vagas em Universidades Públicas, e principalmente a explosão de vagas nas faculdades privadas, promoveu a facilidade de formação em cursos de graduação na área da saúde, por outro lado trouxe uma nova configuração para o mercado de trabalho, transformando-o completamente.

A formação desenfreada e descontrolada de profissionais de saúde pelas escolas privadas, que em muitas vezes preza o interesse pelo lucro e não na formação de qualidade (Machado, 2007), tem aumentado a cada semestre o número de profissionais de saúde no Brasil, que passam a competir nesse novo cenário do trabalho.

Hoje temos uma acirrada competição por ocupações no mercado de trabalho que obviamente gera um achatamento dos salários dos trabalhadores. Isso acontece tanto na graduação quanto no ensino médio profissionalizante.

Fora a área de Medicina que tem um grande poder de pressão “nas instâncias gestoras da educação para frear a abertura de novos cursos” e cobrar qualidade dos já existentes (Fiocruz – 2006), as demais áreas da saúde vêem, a cada ano, um aumento assustador de cursos de graduação como a enfermagem, a odontologia, a fisioterapia, a nutrição, a assistência social e a farmácia, dentre outras, serem abertos em faculdades privadas, de forma desordenada e mal distribuída pelas regiões brasileiras.

Discutir a qualidade da formação desses profissionais e se essa formação tem o olhar para o SUS e perfil profissional que responde às necessidades epidemiológicas da população, já não é novidade.

O que necessitamos saber é de qual será o limite de formação de profissionais de saúde de que o SUS necessita, até porque há investimento de dinheiro público pelo governo federal nessa formação através de vários programas governamentais.

Não digo isso por causa de reserva de mercado para os trabalhadores já graduados, mas porque é necessário planejar a formação profissional na área da saúde, inclusive direcionar a instalação de faculdades (interiorização) para as regiões mais próximas onde os estudantes residem e onde vão trabalhar, e dessa forma minimizar os impactos da falta de trabalhadores da saúde em locais de difícil fixação.

E de que forma haverá a absorção dessa mão de obra para o SUS com o arcabouço jurídico-tributário que prevalece hoje na administração pública?

Por fim, a regulamentação da EC 29 e a revisão da Lei de Responsabilidade Fiscal já apontada pelos trabalhadores em diversas reuniões da Mesa Nacional de Negociação e em eventos do Comitê de Desprecarização e corroborada em artigos publicados - por Campos, Machado e Girardi (2009) – que também propõem a revisão do pacto federativo, com redefinição das responsabilidades e atribuições dos entes federados, e a reforma tributária, que permitirá uma adequada distribuição dos tributos, é uma necessidade urgente e agenda para o próximo ano legislativo e executivo.

Os trabalhadores de saúde e a população brasileira já não podem mais conviver com a realidade do SUS, uma grande política pública de inclusão social, e as limitações impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que dificulta a gestão eficaz do trabalho e produz de certa forma a precarização do trabalhador, não lhe proporcionando perspectivas de carreira e até impossibilitando a ampliação do quadro de servidores num eventual aumento da demanda por serviços de saúde.

Um grande desafio a ser enfrentado pela gestão do trabalho, nos três entes federados, é consolidar o Sistema Nacional de Negociação Permanente do SUS e fortalecer as Mesas de Negociação já implantadas, como um importante instrumento de gestão, e a sensibilização dos gestores e trabalhadores da saúde, através de suas representações sindicais, para a implantação de Mesas de Negociação nos municípios e Estados, onde ainda não existem.


• Programas de interiorização de Médicos:
Os governos federais implantaram quatro programas que tiveram interiorização de médicos entre suas metas: Projeto Rondon e o Programa de Interiorização das
Ações de Saúde e Saneamento (PIASS) – antes do SUS – e o Programa de Interiorização do Sistema Único de Saúde (1993) e o Programa de Interiorização do Trabalho em Saúde (PITS), em 2000.

• Empregos Públicos:
Em 2005 já havia 2,5 milhões de empregos diretos de saúde, com grande concentração na rede municipal (5.565 municípios).

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