CNTSS > ARTIGOS > 17 DE SETEMBRO: DIA MUNDIAL CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DA ÁREA DA SAÚDE
17/09/2015
O fenômeno crescente da terceirização, tão veementemente combatido pelos trabalhadores em todo o planeta, tem seus “tentáculos” lançados indistintamente de forma predatória em direção aos setores privado e público. No país, um dos mais recentes ataques vivenciados foi a disputa ocorrida na sociedade sobre a aprovação ou não do Projeto de Lei da Câmara 30/2015 (antigo PL nº 4330), que trata deste assunto e potencializa a precarização das relações de trabalho em todas as esferas do mercado. No campo público o setor que mais sofre as consequências deste problema e a área de Saúde, mais especificamente o SUS – Sistema Único de Saúde.
A criação do SUS foi resultado da obstinação dos movimentos sociais e dos profissionais da área de saúde que disputaram nos âmbitos social e institucional para ver configurado um sistema de saúde que garantisse à população brasileira um atendimento pautado na integralidade, universalidade e equidade. Uma conquista que se fez perpetuar no texto da Constituição Federal de 1988. Mesmo com esta vitória, o SUS é permanentemente vítima de ataques neoliberais e privatizantes de setores da sociedade interessados em desconfigurar as propostas contidas na Carta de 1988. A finalidade destas intervenções é entregar ao setor privado o atendimento em saúde por meio da terceirização dos serviços.
O segmento neoliberal da sociedade vê nesta ofensiva uma maneira de consolidar o Estado Mínimo de Direito. Segundo os defensores desta linha de raciocínio, esta é uma forma de enxugar e desburocratizar a máquina do governo. Porém, sabemos que se trata de mais uma investida do capital a atividades produtivas capazes de potencializar seus lucros, seja na forma de monopólio ou pela “mais valia” obtida com a exploração do trabalho dos profissionais. Iniciativas desta natureza não são novas em nosso país, datando as primeiras investidas já na década de 1960, tendo seu maior ímpeto a partir de 1980.
A Constituição Federal de 1988 determina que a realização dos serviços de saúde públicos aconteça na esfera estatal, podendo apenas os complementares ser realizados pela iniciativa privada - tendo como preferência a execução por entidades sem fins lucrativos. A possibilidade da terceirização no setor público tem sido utilizada por muitos governantes como forma de burlar a necessidade de realizar concorrências públicas para aquisição de materiais e serviços e também de concursos para contratação de trabalhadores.
Recursos públicos escoam para iniciativa privada
Os estudiosos da área dizem que este é um caminho que favorece aos entes da Federação que possuem orçamentos comprometidos e que também se utilizam do pressuposto de não terem suporte técnico para gerenciar serviços mais complexos em saúde. Assim, por exemplo, inaugura-se a unidade de saúde sabendo que será imediatamente entregue para a gestão de terceiros. Uma prática comum utilizada até por governos de grande porte que veem na terceirização uma maneira de não respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Se observarmos São Paulo, o Estado com maior Orçamento no país, perceberemos que a terceirização na saúde não difere muito deste modelo, pois não acontece apenas pela contratação de serviços, mas também pela entrega de unidades de saúde para serem totalmente administradas por terceiros. São Organizações Sociais (OSs), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OCIPSs), Cooperativas, Associações, Universidades e tantas outras formas de terceirização de serviços.
Vemos claramente os recursos públicos sendo entregues para a iniciativa privada. São entidades que recebem verbas em virtude da transferência da gestão, operacionalização e execução dos atendimentos prestados à população. São situações que favorecem grandemente as entidades contratadas, pois estas não disponibilizam estrutura, não trazem equipamentos e nem tecnologia e se utilizam dos recursos do SUS para obterem lucros. Outro aspecto que merece uma atenção especial diz respeito à valorização das varias categorias profissionais que atuam cotidianamente no sistema. A utilização cada vez maior da terceirização impede a integração destas diversas categorias e, consequentemente, enfraquece a luta dos trabalhadores.
A legislação brasileira é bem clara ao determinar que as administrações públicas só possam contratar instituições privadas para prestação de serviços de saúde em caráter de complementaridade. Este preceito consta na Constituição Federal de 1988 e na Lei Orgânica da Saúde nº 8.080/1990. No caso desta lei, fica ainda mais ostensiva a determinação de que estas contratações devam acontecer apenas temporariamente, não sendo possível substituir a atuação pública. Ambas as legislações entendem as atividades complementares como sendo “atividades-meio”, como exemplos os serviços técnicos especializados. Assim, ao delegar a administração completa de um equipamento de saúde à iniciativa privada os governos estariam também incluindo a execução de funções reconhecidas como “atividades-fim”.
Esta discussão sobre a terceirização das “atividades-meio” e “atividades-fim” se cristalizou na forma de um intenso debate quando da apreciação do PLC 30/2015. A CUT – Central Única dos Trabalhadores e as demais centrais sindicais progressistas, assim como a CNTSS/CUT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social, demonstraram à época que os termos do PLC causariam fortes transtornos para a classe trabalhadora. A ação predatória da iniciativa privada seria favorecida em detrimento da manutenção de serviços importantes e de direitos trabalhistas já conquistados nos setores público e privado.
O mito da eficiência ou agilidade do sistema
O que está em jogo no SUS é sua consolidação como instrumento eficaz da política pública de saúde em todas as esferas de governo. O SUS é reconhecido internacionalmente como política bem sucedida. Os trabalhadores e movimentos sociais organizados buscam sempre qualificar a ação do sistema com vistas a produzir excelência no atendimento à população. Municípios, Estados e União precisam cumprir os preceitos legais que estabelecem os critérios para o desenvolvimento do SUS.
A prática de terceirização em nome de pretensa “eficiência” ou “agilidade do sistema” traz mais prejuízos do que vantagens ao SUS, ao erário público e à população. Argumentos como estes são utilizados para que o capital internacional se aproxime cada vez mais do mercado de saúde brasileiro. Recentemente tivemos a aprovação na Câmara Federal da Medida Provisória nº 656/2014, encaminhada ao Poder Executivo Federal como o Projeto de Lei de Conversão nº 18, e que foi sancionada pela presidenta da República. Investida com esta finalidade já havia acontecido em 1998, com a lei que regulamenta os Planos de Saúde. A partir desta legislação, operadoras de capital internacional foram autorizadas a comprar planos no Brasil.
A privatização/terceirização da saúde é um fenômeno presente em nosso país e que merece ser atacado. A Confederação e a CUT sempre defenderam mais recursos financeiros para a área de saúde, mais infraestrutura para as redes de atendimento de todo o país e mais investimentos na contratação, qualificação e valorização dos profissionais que atuam no SUS.
A Confederação não concorda com as críticas feitas por setores conservadores da sociedade que lutam contra o SUS e que buscam ampliar a inserção da iniciativa privada no atendimento à saúde em nosso país. Discordamos da prática de desmoralizar o atendimento prestado pelo Estado em saúde pública, assim como do processo de precarização das relações de trabalho a partir da terceirização. É por este motivo que a Confederação e a ISP – Internacional de Serviços Públicos promovem neste dia 17 de setembro, em concordância com o Dia mundial contra a privatização da área de saúde, atividades diversas pelo país que apontem para esta luta contra a privatização da área de saúde.
Célia Regina Costa é secretária Geral da CNTSS/CUT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social
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