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DILMA E A FÉ CRISTÃ
DILMA E A FÉ CRISTÃ
14/10/2010
Artigo publicado na FOLHA DE SÃO PAULO EM 10/10/2010
Frei Betto
Conheço Dilma Rousseff desde criança. Éramos vizinhos na rua
Major Lopes, em Belo Horizonte. Ela e Thereza, minha irmã, foram
amigas de adolescência.
Anos depois, Dilma e eu nos encontramos no Presídio Tiradentes,
em São Paulo. Ela na ala feminina, eu na masculina, com a vantagem de,
como frade, obter permissão para, aos domingos, monitorar celebração
litúrgica na Torre, como era conhecido o espaço que abrigava as presas
políticas.
Aluna de colégio religioso na juventude, dirigido pelas freiras
de Sion, Dilma, no cárcere, participava ativamente de orações e
comentários do Evangelho. Nada tinha de “marxista ateia”. Aliás, raros
os presos políticos que professavam convictamente o ateísmo. Nossos
torturadores, sim, o faziam escancaradamente ao profanarem, com toda
violência, os templos vivos de Deus: suas vítimas levadas ao
pau-de-arara, ao choque elétrico, ao afogamento e à morte.
Em 2003, deu-se meu terceiro encontro com Dilma, em Brasília, nos
dois anos em que participei do governo Lula.
De nossa amizade posso assegurar que não passa de campanha
difamatória - diria mesmo, terrorista - acusar Dilma Rousseff de
“abortista” ou contrária aos princípios evangélicos. Se um ou outro
bispo critica Dilma, há que lembrar que, por ser bispo, nenhum homem é
santo.
Poucos bispos na América Latina apoiaram ditaduras militares,
absolveram torturadores, celebraram missa na capela de Pinochet...
Bispos também mentem e, por isso, devem, como todo cristão, orar
diariamente “perdoai as nossas ofensas...”
Dilma, como Lula, é pessoa de fé cristã, formada na Igreja
Católica. Na linha do que recomenda Jesus, ela e Lula não saem por aí
propalando, como fariseus, suas convicções religiosas. Preferem
comprovar, por suas atitudes, que “a árvore se conhece pelos frutos”,
como acentua o Evangelho. É na coerência de suas ações, na ética de
seus procedimentos políticos, na dedicação ao povo brasileiro, que
políticos como Dilma e Lula testemunham a fé que abraçam.
Sobre Lula, desde as greves do ABC, espalharam horrores: que, se
eleito, tomaria as mansões do Morumbi, em São Paulo; expropriaria
sítios e fazendas produtivos; implantaria o socialismo por decreto...
Passados quase oito anos, o que vemos? Vemos um Brasil mais
justo, com menos miséria e mais distribuição de renda, sem
criminalizar movimentos sociais ou privatizar o patrimônio público,
respeitado internacionalmente.
Nas breves semanas que nos separam hoje do segundo turno, forças
de oposição ao governo Lula haverão de fazer eco a todo tipo de
boataria e mentiras. Mas não podem alterar a essência de uma pessoa.
Em toda a trajetória de Dilma, em tudo que ela realizou, falou ou
escreveu, jamais se encontrará uma única linha contrária ao conteúdo
da fé cristã e aos princípios do Evangelho.
Certa vez, relata o evangelista Mateus, indagaram de Jesus quem
haveria de se salvar. Para surpresa dos que o interrogaram, ele não
respondeu que seriam aqueles que vivem batendo no peito e proclamando
o nome de Deus. Nem disse que seriam aqueles que vão à missa ou ao
culto todos os domingos. Nem disse que seriam aqueles que se julgam
donos da doutrina cristã e se arvoram em juízes de seus semelhantes.
A resposta de Jesus surpreendeu-os: “Eu tive fome e me destes de
comer; tive sede e me destes de beber; estive enfermo e me visitastes;
nu e me vestistes; oprimido, e me libertastes...” (Mateus 25, 31-46)
Jesus se colocou no lugar dos mais pobres e frisou que a salvação
está ao alcance de quem, por amor, busca saciar a fome dos miseráveis,
não se omite diante das opressões, procura assegurar a todos uma vida
digna e feliz.
Isso o governo Lula tem feito, segundo opinião de 77% da
população brasileira, como demonstram as pesquisas. Com certeza,
Dilma, se eleita presidente, prosseguirá na mesma direção.
Frei Betto é escritor, autor de “Um homem chamado Jesus” (Rocco),
entre outros livros - www.freibetto.org twitter:@freibetto