Relatório sobre a Epidemia Global de Aids, divulgado pelo Programa das Nações Unidas sobre HIV/Aids aponta que a epidemia se concentra nos países mais pobres, cresce entre os jovens e as mulheres. Também aumenta o número de pessoas que vivem com o virus em todo o mundo. No Brasil, a doença está estabilizada nos grandes centros urbanos e cresce nas periferias e cidades do interior.
O Programa das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) alertou, durante o lançamento do Relatório sobre a Epidemia Global de Aids no último dia 24, que a epidemia da doença tem avançado e que os esforços de prevenção não acompanham o ritmo das mudanças. Apesar de o relatório indicar uma queda de 17% nas novas infecções pelo vírus, o coordenador do Unaids no Brasil, Pedro Chequer, avaliou que os dados ainda preocupam. O Unaids aponta a América Latina como a região com maior cobertura de medicamento antirretroviral - das 445 mil pessoas em tratamento, 180 mil estão no Brasil.
Durante o lançamento do documento, ele destacou uma espécie de novo perfil da aids, já que os picos de maior número de infectados e de maior número de mortes foram registrados em 1996 e 2004. Os dados atuais revelam que o número de pessoas que vivem com a doença nunca foi tão grande e já soma 33,4 milhões de infectados.
“Há necessidade de uma reflexão profunda do ponto de vista de políticas públicas para que possamos enfrentar essa epidemia”, disse Chequer. Desde o início da epidemia, 60 milhões foram infectadas e 25 milhões já morreram em consequência da doença.
Atualmente, surgem mais de 7.400 novos casos por dia - mais de 97% deles em países de baixa ou média renda e 40% entre jovens maiores de 15 anos. Para Chequer, a população jovem tem se mostrado vulnerável ao HIV por conta da falta de informação e de acesso aos meios de prevenção.
Recorte de gênero
As infecções por HIV em mulheres na faixa etária de 15 a 24 anos chegam a representar 75% do total em todo o mundo, de acordo com documento da Unaids. Para a ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire, a desigualdade de gênero e a violência contra a mulher dificultam a prevenção à doença.
Ao comentar os dados do Relatório sobre a Epidemia Global de Aids 2009, ela destacou que é preciso olhar para o futuro com alguma esperança, mas tendo a certeza de que o ritmo de redução da epidemia de aids será muito menor do que o esperado. A ministra afirmou ainda que há uma “feminização” no avanço da doença no mundo.
Ao participar do lançamento do relatório, Nilcéa lembrou a dificuldade de muitas mulheres em negociar o uso do preservativo com seus parceiros, o que provoca diagnósticos tardios. Ela citou ainda o despreparo e a falta de conhecimento, além da discriminação por parte dos próprios profissionais de saúde, em relação a mulheres soropositivas.
“Desde 2007, estratégia específica para tratar o HIV entre as mulheres inclui o acesso à informação, à prevenção, ao tratamento e inclui a desigualdade de gênero e a violência como fatores determinantes na infecção”, disse.
Outro problema detectado no relatório é a dificuldade de conter a transmissão vertical - quando o vírus é passado de mãe para filho durante a gestação, no momento do parto ou mesmo com o aleitamento materno. A vacina que previna esse tipo de contágio existe desde 1997, mas não há uma demanda social forte. “Esse distanciamento em relação a um tema crônico tem dificultado e não há mobilização dos profissionais de saúde”, afirmou, Pedro Chequer ao lembrar que algumas gestantes ainda fazem o pré-natal sem passar pelo teste e sem tratamento para a aids.
Entre as prioridades para 2009, o Unaids destacou a prevenção da morte de mães e bebês infectados; a garantia de que pessoas que vivem com o vírus recebam tratamento; o combate às mortes de soropositivos provocadas pela tuberculose; o fim da violência contra mulheres e meninas; o empoderamento (tradução da palavra inglesa empowerment, que significa dar poderes de decisão, participação e autonomia a uma pessoa) de jovens para que se protejam contra a doença; e o fortalecimento de uma rede de proteção social para pessoas infectadas.
A epidemia no Brasil
O balanço divulgado pelo Ministério da Saúde mostra que os casos de aids no Brasil diminuíram nos grandes centros urbanos, mas aumentaram em cidades do interior do país. Dados indicam que, de 1997 a 2007, a taxa de incidência da doença dobrou em municípios com menos de 50 mil habitantes. A análise foi feita com base em casos registrados em 4.867 cidades onde foi notificada pelo menos uma ocorrência da doença (87,5% do total de municípios no país).
De acordo com a diretora do departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, Mariangela Simão, o orçamento deste ano para combate e tratamento do HIV/Aids é de R$ 1,4 bilhão. Por ano, os gastos com apenas um paciente soropositivo variam de US$ 670 a US$ 22 mil.
A pesquisa mostra queda nos grandes centros urbanos entre 1997 e 2007 foi de 15%, com a taxa de incidência passando de 32,7 notificações para cada 100 mil habitantes para 27,4. Ao todo, 24 dos 39 municípios com mais de 500 mil habitantes registraram queda da doença considerada significativa. Ainda assim, eles concentram 52% dos casos de aids no país - 283.191 no total.
As cidades do interior do país, em 1996, apresentavam índices oito vezes menores que os dos grandes centros. Mas, em 2007, os números passaram a ser apenas três vezes menores. A taxa de incidência nessas localidades subiu de 4,4 para cada 100 mil habitantes para 8,2 e o interior do Brasil já concentra 15,4% dos casos de aids.
Dos 100 municípios com mais de 50 mil habitantes que apresentaram maior taxa de incidência da doença, os 20 primeiros estão na Região Sul. Em primeiro lugar no ranking está a cidade de Porto Alegre, com taxa de incidência de 111,5 por 100 mil habitantes, seguida por Camboriú, em Santa Catarina, com 91,3.
"O que se observa hoje é uma estabilização com tendência de crescimento. O Rio Grande do Sul ainda tem mais do que o dobro da média do Brasil na categoria disposição do uso de drogas injetáveis, isso também pode se uma explicação”, disse Mariângela Simão.
A tendência de crescimento da aids em cidades menores e a queda nos grandes centros, de acordo com o balanço, também foi confirmada nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul. Já o Norte e Nordeste apresentam aumento da taxa de incidência tanto em municípios grandes quanto em pequenos.
Mariângela ressaltou ainda que há uma preocupação grande com a Região Norte, principalmente com os estados de Roraima e do Amapá. “Essas regiões preocupam porque a Guiana Inglesa [atual Guiana], o Suriname e a Guiana Francesa, que fazem fronteira com o país, têm dez vezes a incidência que tem o Brasil e é uma epidemia diferente", disse a diretora, ao destacar que a migração nessa região é muito intensa.
Dados preliminares do ministério indicam que, de 1980 até junho deste ano, foram registrados 544.846 casos de aids no Brasil, além de 217.091 mortes provocadas pela doença. Por ano, são notificados entre 33 mil e 35 mil novos casos. A estimativa é que 630 mil brasileiros já foram infectados pelo HIV em todo o país.
Entre os casos acumulados de 1980 até junho de 2009, a Região Sudeste concentra o maior percentual (59,3%), com 323.069 registros da doença. O Sul registra 19,2% dos casos, com 104.671 notificações; o Nordeste tem 11,9%, com 64.706; o Centro-Oeste 5,7%, com 31.011; e o Norte 3,9%, com 21.389.
Pelo Mundo
O número de infecções pelo vírus HIV em todo o mundo teve queda de 17% nos últimos oito anos. As estimativas indicam que 33,4 milhões de pessoas vivem com o HIV. Desse total, 2,7 milhões foram infectados em 2008. No ano passado, 2 milhões de pessoas morreram em consequência da aids.
O Relatório sobre a Epidemia Global de Aids 2009 revela que, do total de infectados, 31,1 milhões são adultos, sendo que as mulheres representam mais da metade (15,7 milhões) dos soropositivos.
Crianças e adolescentes com menos de 15 anos somam 2,1 milhões de infectados. Em 2008, 430 mil pessoas nessa faixa etária foram contaminadas e o número de mortes de crianças e adolescentes em consequência da doença chegou a 280 mil. Segundo o Unaids, a maioria dos casos de infecção nesse grupo ocorre ainda no útero da mãe, no momento do parto ou logo após o nascimento, por meio da amamentação.
O tratamento antirretroviral de mulheres soropositivas, de acordo com o relatório, repercutiu de maneira importante na prevenção de novas contaminações de mãe para filho. Desde 2001, foram evitadas cerca de 200 mil infecções entre crianças.
Segundo o Unaids, o pico da aids foi registrado em 1996, quando 3,5 milhões de pessoas foram infectadas em todo o mundo. Em um comparativo com os dados de 2008, a queda chega a 30%.
Da redação com informações da Agência Brasil