O Estado de S.Paulo resolveu dar uma olhada no interior do Brasil durante o fim de semana. No domingo (12/4), publicou reportagem anunciando que o governo vai alterar o estatuto dos povos indígenas, que foi criado em 1973, e prever os casos em que os índios deixam de ser inimputáveis.
Na edição de segunda-feira (13), o jornal paulista publica o resultado dos estudos de um geógrafo sobre as complexidades do setor agrário brasileiro, onde convivem empreendimentos sustentáveis, alta tecnologia com práticas medievais de agricultura e trabalho escravo.
O chamado "Brasil profundo" andava longe das páginas dos jornais, constantemente atraídos pela vida mais dinâmica nas grandes cidades, com seus problemas complexos e a grandiosidade de seus números. Por essa razão, é bom sinal o fato de um dos principais diários de influência nacional dedicar algum esforço - ainda que seja analisar um trabalho acadêmico ou um projeto de lei - para tentar entender o Brasil que se estende pelo interior do continente.
A reportagem sobre o fim da inimputabilidade dos indígenas, por exemplo, revela os cuidados dos legisladores em conhecer as características dos povos nativos, para definir em que circunstâncias seus integrantes podem ser responsabilizados criminalmente segundo as normas dos brancos.
Vivência de repórter
De certa maneira, olhar a questão indígena sem condescendência é uma forma de também superar preconceitos e restringir a desinformação que grassa nas zonas urbanas sobre o que é realmente a vida de índio.
A reportagem sobre o Atlas da Questão Agrária Brasileira, tese de doutorado do geógrafo Eduardo Gerardi, da Universidade Estadual Paulista, também merece registro, por finalmente oferecer um retrato amplo do mundo agrário, que é composto não apenas pelos agronegócios e pelos movimentos sociais dos sem terra, sempre mais visíveis na mídia.
Ambas iniciativas são excelentes. O problema é que os jornais apenas visitam o Brasil profundo muito esporadicamente, e quase sempre sem sair do conforto do ar condicionado. Sem a vivência do repórter, sem a descrição ao vivo da realidade que se vive além das linhas de edifícios da cidade, o Brasil interno ainda é um território praticamente desconhecido pela imprensa.