08 de março: Dia Internacional da Mulher com novos tempos e novas políticas
Publicado: 07 Março, 2023 - 15h05
“35 mulheres foram agredidas física ou verbalmente por minuto no Brasil em 2022”. Este é um dos destaques da matéria publicada pelo jornal Folha de S.Paulo na semana que antecede o 08 de março, o Dia Internacional da Mulher. Isto significa que 28,9% das mulheres, ou seja, 18,6 milhões foram vítimas de algum tipo de violência. Um percentual superior à media mundial, apontado em 27% pela Organização Mundial da Saúde. Há, ainda, o diagnóstico do crescimento de casos de violência grave, que podem levar à morte, assim como todas as demais formas de violência: 50.692 mulheres sofreram violência diariamente no país no ano que passou.
Os dados apresentados até aqui são resultados da pesquisa "Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil", encomenda pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública ao Instituto Datafolha, e realizada durante a primeira quinzena de janeiro deste ano. De acordo com os pesquisadores, o número de mulheres vítimas de violência é o maior da serie histórica realizada pelo Fórum. Um retrato gravíssimo e cruel da violência contra a mulher em nosso país, que ganhou contorno ainda mais intenso com os longos e duros anos de governo do misógino e famigerado Bolsonaro, que sabotou as políticas públicas de gênero e enalteceu a violência com sua política armamentista e sua postura criminosamente negligente quanto à punição dos crimes desta natureza.
Como referência ao desmonte realizado pelo governo passado nesta área basta observar os dados denunciados recentemente pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC). De acordo com levantamento feito pela entidade, a gestão que deixou o poder no último ano propôs no Orçamento da União, nos quatro anos de sua péssima administração, 94% menos recursos para as políticas específicas de combate à violência contra a mulher do que nos quatro anos de Temer. Segundo o estudo, o desmonte só não foi completo porque o Congresso Nacional realizou ajustes neste orçamento diminuindo o prejuízo.
Aumento da violência foi permanente nos últimos quatro anos
Os estragos deixados pelo último governo são imensos. O estudo do Fórum demonstra o aumento das ameaças feitas com o uso de armas, claramente influenciado pela política belicista levada a cabo pelo recém defenestrado chefe do Executivo Federal. É evidente que isto potencializa o feminicídio e aumenta os atos de extrema violência, inclusive aproximando da esfera familiar. O Fórum denunciou que no primeiro semestre de 2022, 699 mulheres foram vítimas de feminicídio. A pesquisa evidenciou que a maioria dos causadores de tanta dor tem rosto e nome reconhecido: 31,3% das situações de violência graves recaem sobre o ex-companheiro; 26,7% sobre os atuais companheiros; e 24,5% por desconhecidos.
O estudo também diagnosticou que a ocorrência de violência é maior contra as mulheres negras. No recorte de violência física, a pesquisa aponta que 45% deste segmento sofreram algum tipo de violência ou agressão ao longo da vida, sendo que entre as mulheres brancas o percentual é de 36,9%. Das mulheres que sofreram violência 65,6% eram negras, 29% brancas, 2,3% amarelas e 3% indígenas. Para os pesquisadores, estes números são um sinal do racismo estrutural no país. Observam que há outro elemento perturbador: as políticas públicas se apresentam ineficazes com as mulheres negras. O caminho para reversão deste quadro seria,então, um olhar observando as especificidades deste segmento social.
Há vários indicadores gravíssimos da realidade opressora vivida pelas mulheres. Ocorre ainda uma violência “camuflada”, quando existe um índice expressivo de mulheres que não denunciam a agressão, cerca de 45% dos casos. No foro da ação policial, apenas 4,8% acionaram a Polícia Militar, e somente 1,7% denunciaram via registro eletrônico. Este é um problema sério que para tentar reverter, segundo os mesmos pesquisadores, deve-se ampliar a garantia do acolhimento e a ampliação da capacidade de abrigar mulheres em situação de violência e seus dependentes.
A pesquisa pôde identificar algumas causas que levaram a este fenômeno do aumento da violência, entre elas: “fim de financiamentos das políticas de enfrentamento à violência contra a mulher nos últimos quatro anos; a pandemia de Covid-19 comprometeu o funcionamento de serviços de acolhimento às mulheres; ação política de movimentos ultraconservadores que se intensificaram na última década e elegeram, dentre outros temas, a igualdade de gênero como um tema a ser combatido”.
Um novo momento
O desmonte das políticas públicas deste setor só não foi maior pela resistência travada pelos movimentos feminista e sindical que ocuparam todos os espaços políticos e sociais para denunciar as mazelas cometidas e bloquear o avanço desenfreado da barbárie. Nas agendas de comemoração do mês da mulher deste ano, cujo destaque é o 08 de março, a classe trabalhadora focará nos temas sobre combate à violência contra a mulher nas suas mais diversas formas e a necessidade urgente de retomada de investimentos em políticas públicas para este setor.
As ruas e os demais espaços da sociedade serão tomados com um olhar também focado sobre a violência contra a população trans. A nossa Central sindical tem denunciado esta violência e destacou recentemente os números da mortandade desta população. Em 2021, foram mortas 135 travestis e mulheres travestis e cinco casos de homens trans e pessoas transmasculinas. É fundamental levar este debate para toda a sociedade e ao Parlamento para que se combata efetivamente o discurso bolsonarista não só no aspecto da misoginia, como também da homofobia e da transfobia.
A retomada de um governo democrático e popular comandado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva revigora a capacidade de luta e a possibilidade de avanços. A extensa participação de mulheres chefiando vários de seus ministérios, num total de onze, e nos demais espaços de destaque do governo já sinaliza para uma guinada no que se viveu nos últimos anos. Pode-se dizer que estamos presenciando uma forma de responder a uma demanda explicita dos movimentos feminino e sindical por mais mulheres nas esferas decisórias e de poder. Simbólico também foi o lançamento, no início deste mês do slogan “O governo que respeita todas as mulheres”.
Com a indicação de uma ministra comprometida com o empoderamento das lutas das mulheres foi possível que os movimentos organizados conquistassem junto a este Ministério o compromisso pelo desenvolvimento de políticas públicas que fortaleçam as mulheres em situação de vulnerabilidade e nos espaços de poder. Esta ação integrada das mulheres fez com que já nos primeiros momentos desta nova gestão federal o atual governo se preocupasse com estratégias a curto, médio e longo prazo neste setor. Há o indicativo que no 08 de março será apresentado um conjunto de medidas em que o tema da mulher terá seu destaque matricial e envolverá vários ministérios no desenvolvimento de políticas afirmativas para as mulheres.
Entre as conquistas iniciais do movimento de mulheres nestas primeiras semanas do novo governo está a revogação da Portaria contrária aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e do cuidado integral à saúde da mulher. Outra vitória aconteceu com a retomada do protagonismo feminino nesta nova retomada do Programa Bolsa Família. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também se comprometeu que encaminhará ao Congresso Nacional um projeto de lei para garantir a igualdade salarial entre homens e mulheres. A nossa Central há anos vem lutando para garantir direitos iguais para trabalhos iguais entre homens e mulheres.
A proposta do atual governo é levar este debate para a sociedade, Parlamento e Judiciário para que se efetue um pacto para aprovação da medida, uma vez que sua aprovação não depende exclusivamente do poder Executivo Federal. A classe trabalhadora está preparada para atuar firmemente para que esta lei seja aprovada. Trata-se de uma luta história na defesa da valorização profissional das mulheres.
Maria de Fátima Veloso é secretária de Mulheres da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS/CUT) e secretária nacional adjunta de Saúde do Trabalhador da Central Única dos Trabalhadores (CUT)