No encontro, que reuniu mais de 500 pessoas dos três segmentos, na noite de sexta (6/5), o ministro Alexandre Padilha ouviu propostas e comentou os desafios para evitar “um apartheid de quem tem plano de saúde e quem não tem”.
Vitalidade e energia militante. Foram as características centrais do encontro entre petistas e o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, na noite de sexta-feira (6/5), no encontro promovido pelo Diretório Estadual do PT-SP, na capital paulista.
Cerca de 500 pessoas lotaram o auditório do Sindicato dos Engenheiros na atividade que durante cinco horas debateu o modelo de gestão, os problemas na relação com o Estado de São Paulo, o desmonte do Sistema Único de Saúde pelos governos do PSDB/DEM/PSD, controle social e a política de saúde pública do Ministério em São Paulo.
Parlamentares, ativistas dos mais variados movimentos sociais e segmentos da saúde, relataram a terceirização dos serviços em São Paulo, o repasse de leitos públicos para convênios e particulares, filas, o crescimento de epidemias no Estado, falta de diálogo, a desvalorização dos servidores e o impedimento dos conselhos exercerem o controle dos investimentos no setor na capital e estado.
Um documento, produzido pelos movimentos que integram o Setorial da Saúde do PT-SP, foi entregue ao ministro da Saúde. Dentre as solicitações, os ativistas denunciam que os governos municipal e estadual não cumprem a Emenda Constitucional 29 de 2000, que define os percentuais que cada ente deve destinar à saúde pública. Em nove anos, R$ 4,5 bilhões deixaram de ser aplicados na área. “Uma auditoria do DenaSus, feita em 2009, revelou que entre os anos de 2006 e 2007 não foram aplicados R$ 2,1 bilhões”, frisa um dos trechos da pauta.
Desafios
Dezenas de lideranças denunciaram durante a plenária a precarização do serviços de saúde, produzida pela gestão terceirizada às Organizações Sociais, a desvalorização dos servidores e o desmonte do SUS em São Paulo. As OSs têm o controle de 30 hospitais, 37 ambulatórios médicos de especialidades (AMEs), central de regulação de vagas e exames.
Gestores municipais acrescentaram que o Estado de São Paulo é ausente na participação do financiamento dos programas federais: Estratégia Saúde da Família (ESF), Brasil Sorridente, Centro de Atenção Psicossocial (Caps), Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu) e Unidade de Pronto-Atendimento (UPA).
Dentre as propostas entregues ao ministro, o movimento enfatizou a regulamentação da Proposta de Emenda Constitucional 29, para o financiamento do sistema, com a priorização de contrapartidas do Estado para áreas de estrangulamento, como atenção básica e média complexidade. Segundo eles, o plano de valorização da carreira deve ser parte do Pacto pelo SUS e regulamentação da PEC 29. Medidas de qualificação dos servidores da saúde e alternativas à falta de profissionais em algumas especialidades, como pediatria, clínico-geral, também integram o conteúdo da discussão.
“Queremos a efetivação do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Uma saúde não fragmentada, que as mulheres sejam tratadas de forma integral. Queremos políticas de Estado, acabar com a mortalidade materna, avançar no debate da descriminalização do aborto”, pontuou Sonia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres.
O atraso de mais de duas horas do ministro Alexandre Padilha, ocasionado pelo vôo que o trouxe de Recife (PE), onde anunciava numa atividade a construção de cinco maternidades, não desmobilizou o plenário. Aplaudido em sua chegada, o ministro se sentou à mesa e ouviu com atenção as demandas, desafios e propostas no encontro que reuniu representantes de usuários, gestores/as e trabalhadores/as.
Ao elogiar a determinação militante dos petistas na discussão, que integra a série de debates que o PT Estadual vem promovendo com os ministros do governo Dilma, o ministro Alexandre Padilha afirmou que o Sistema Único de Saúde se consolidará somente no interior de uma aliança da sociedade brasileira. “Ou nós avançamos para a consolidação do sistema ou iremos intensificar a separação, um verdadeiro apartheid de quem tem plano de saúde e quem não tem”, vaticinou, ao alertar que existem 45 milhões de pessoas com plano médico e 14 milhões com plano odontológico. “Corresponde a uma Inglaterra inteira”.
Na avaliação do secretário de saúde da CUT/SP, Luiz Antonio Queiroz, o fortalecimento do SUS passa por intensificar o debate e apoio no movimento sindical e movimentos sociais já que as OSS significam a representação de empresas gerindo a saúde pública, com o repasse do dinheiro público mal investido. “Os ataques midiáticos acentuam pontos negativos da saúde pública e escondem os positivos. É preciso desmontar esse ataque e revelar que as OSs custam 50% mais caro que os hospitais públicos”, reforçou.
O presidente estadual do PT-SP, deputado estadual Edinho Silva, afirmou que defender SUS é defender a cidadania. “Porém, não podemos apenas ficar nas denúncias, é preciso apresentar soluções para os problemas do SUS. Esse é o desafio do nosso Partido”, defendeu o presidente do PT-SP, ao elogiar a vinda do ministro para debater um assunto que é sensível para a sociedade e que possibilita ao Partido fazer a afirmação do sistema público e universal na área da saúde.
Em sua intervenção, Edinho pontuou como desafios a necessidade de rever o teto financeiro, a vacância de médicos nos concursos das cidades do interior, que exigirá um enfrentamento com o CRM, ter o controle da contratualização com hospitais filantrópicos, estabelecendo indicadores e metas, abandonar a ideologização do debate para a construção de uma agenda para o fortalecimento do SUS.
O vereador Antonio Donato, presidente do Diretório Municipal do PT de São Paulo, que passou pouco antes no evento, parabenizou a iniciativa e convidou para o encontro que está sendo organizado para este mês com os conselheiros municipais e locais para debater essa agenda conjunta, que na cidade inclui os três hospitais anunciados pelo prefeito Kassab que não serão construídos, a transferência de quase R$ 2 bilhões/ano às OSs sem controle social, o fechamento do Hospital Sorocabana, que recebe recursos do SUS.
Diálogo com a sociedade
Para enfrentar os inúmeros desafios que estão postos, Padilha acredita que a 14a Conferência Nacional de Saúde, prevista para ocorrer em dezembro deste ano, deve atrair nas etapas municipais e estaduais o diálogo com os mais variados setores da sociedade, para que o conjunto da sociedade entenda a saúde como estratégico para o crescimento do País e garanta o que é fundamental para o país. “Esse país só será grande, crescendo economia, gerando empregos e forte, se o sistema estiver forte e consolidado. Não é possível ser a quinta economia do mundo sem aproveitar ao máximo o potencial do setor econômico que mais investe em inovação e desenvolvimento tecnológico, que é a Saúde”, reforçou ao citar números assegurados pelo sistema, que realiza 21 mil transplantes e 3,5 milhões de consultas a cada ano. “Não existe no mundo um sistema universal público como o SUS, portanto há que ter uma política de Estado para o financiamento da saúde. Tem que ser uma regra estável, por meio da regulamentação da Emenda Constitucional 29. A saúde necessita de regra estável que indique quanto União, estados e municípios tem que colocar e precisamos de recursos crescentes correspondente ao crescimento da economia, para que possamos chegar a patamares semelhantes à saúde suplementar no Brasil ou mesmo com outros países que tem sistemas nacionais de saúde”.
Ele não crê que mudará a percepção da área ante à população sem a qualificação das portas de entrada do SUS, da unidade básica de saúde à urgência e emergência, para garantir a universalidade do acesso, mas salientou a necessidade de repensar normas construídas nos anos 1970, que não dialogam com o conjunto da população. Assim como a quantidade de profissionais, humanizar o atendimento, combinar formas de gestão, pela heterogeneidade do país, sem abrir mão do controle público. Ele também valorizou a parceria com os municípios, para o grande embate que há com o governo do Estado, para reconstruir aliança com o usuário e o fortalecimento do sistema.
Políticas do Ministério da Saúde
Sobre as ações que estão sendo planejadas, será pactuado em maio com secretários municipais e estaduais na Comissão Tripartite, uma política de urgência/emergência, a partir dos 230 prontos-socorros mais importantes do país, os 50 hospitais universitários federais e tem uma rede de hospitais federais no Rio de Janeiro. A saúde da pessoa idosa, a ampliação da Rede Cegonha, o reconhecimento de doulas, obsterizes e parteiras, além da ampliação da saúde mental foram comentadas. O ministro disse ainda que está sendo elaborada uma pesquisa sobre o crack para planejar ações adequadas. Ele defendeu o estabelecimento de indicadores e metas para otimização serviços, a fiscalização, o investimento na qualidade de profissionais, mas também na quantidade.
“O Brasil hoje tem 1,6 médico por mil habitantes. A Inglaterra tem 2,5. Espanha tem 4, o Canadá tem 3 por mil habitantes. Quem disse que o Brasil não tem de formar médicos. Mas é claro que tem regiões que extrapolam a média do Estado”, comparou.
Para os estudantes brasileiros que estão fazendo Medicina em outros países, o ministro disse que no segundo semestre já será aplicado um novo exame nacional, substituindo a dependência de algumas instituições que faziam o exame anteriormente. “A ideia do exame nacional é importante para não ficar refém de instituições de ensino locais e rever o critério para ter uma nota de corte mais adequada a avaliar a qualidade do profissional. Esse exame vai ocorrer no segundo semestre, todo mundo que se formou fora do país pode prestar e essa será uma forma positiva de trazer esses profissionais que querem trabalhar no Brasil para que eles tenham os seus diplomas validados”, esclareceu o ministro, ao citar ainda a experiências com universidades estaduais de aprimoramento já em serviço de jovens que tenham estudado fora do Brasil.
Ao alertar que o Brasil tem que pensar quantos profissionais precisará em 2020, um debate que não implica em abertura indiscriminada de universidades, no incentivo à disputa do mercado e nem de respostas únicas, mas de diretrizes que estão sendo pensadas para respeitar a diversidade do território nacional. “Temos que fazer um grande debate entre modelo de gestão e de contratação. Travar esse debate no Congresso Nacional, como foi feito há quatro anos permitiu o aumento de fundações, das OSs”.
No encerramento, ele orientou que é preciso pensar modelos, que afirma a gestão pública do SUS. “A opinião de cada um dos representantes é decisiva para acertar os rumos da política do Ministério da Saúde ”
A mesa do encontro mediada pelo coordenador do Setorial de Saúde, Eurípedes B. Carvalho, reuniu também a assessora do ministro da Saúde, Eliane Cruz, os prefeitos Milton Carlos de Mello "Tupã”(Presidente Prudente), Augusto Pereira (Santo Antonio do Pinhal), os secretários do PT-SP, Wellington Diniz (Movimentos Populares) e Iduigues F. Martins (Assuntos Institucionais), a secretária-geral Silvana Donatti, o senador Eduardo Suplicy, os deputados federais Antonio Mentor e José Filippi; os deputados estaduais Marcos Martins e Adriano Diogo.
Representantes das bancadas de vereadores da capital e interior, deputados federais, estaduais, secretários/as municipais de saúde, a médica Marcileia Rocha Santos Chaves, mãe do ministro Alexandre Padilha, Zilah Abramo, da Fundação Perseu Abramo, Celso Horta, do jornal ABCD Maior, além de lideranças de conselhos de profissionais, sindicatos, conselhos locais, entidades, associações e estudantes também participaram do encontro com o ministro, encerrado por volta das 23h.