Em entrevista ao Portal do Mundo do Trabalho, a presidenta da CNTSS (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social), Maria Aparecida do Amaral Godoi Faria, fala sobre as Convenções 151, 158 e a campanha da redução da jornada de trabalho sem redução de salário.
Portal do Mundo do Trabalho: Como a CNTSS analisa o envio dos textos das Convenções 151 e 158 para ratificação, ocorrido na semana passada?
Maria Aparecida - É importante que o Brasil e que o Congresso Nacional aprovem e reconheçam as Convenções 151 e 158. A 151 é importante para as entidades do funcionalismo, para a CNTSS e para própria CUT. Ambas já desenvolvem várias atividades junto ao Governo Federal, mais precisamente, ao Ministério do Planejamento, para que haja negociação coletiva no serviço publico, até hoje inexistente.
Pensando em reverter esse quadro, a CUT e a CNTSS construíram diretrizes e um projeto de lei que discute a questão do direito de greve, que para nós está vinculado à questão de direito à negociação. Portanto, é muito importante o presidente Lula assinar e enviar ao Congresso Nacional essas duas convenções que também tratam da demissão sem justa causa, o que reforça o debate com o governo e com a sociedade na luta de bandeiras históricas como a garantia de emprego e de melhores condições do trabalho.
Portal do Mundo do Trabalho: Como a CNTSS vê a avaliação de desempenho adotado pelos governos no serviço público?
Maria Aparecida - O governo federal, de São Paulo, de Minas Gerais e vários outros estados adotaram essa prática que tem como objetivo final a melhoria da qualidade de serviço. Mas o que era para ser um instrumento de melhoria passou a ser de punição porque a avaliação ficou centrada no indivíduo e não instituição. Para que essa modalidade de gestão tenha resultados efetivos é preciso ampliar o conceito e olhar não só o indivíduo, mas a equipe, os instrumentos, o material, a estrutura e a gerência, enfim, a instituição e seu contexto.
Temos que ter cuidado nesse debate que é muito mais amplo do que discutir se a culpa é de um funcionário A ou B. Essa discussão tem que iniciar no local de trabalho e deverá ser ampliada para avaliar a finalidade do serviço e seu desenrolar.
A preocupação é garantir o atendimento ao usuário com um serviço de qualidade. Isso tudo preservando a saúde do trabalhador.
Portal do Mundo do Trabalho: E a campanha da redução da jornada sem redução de salário?
Maria Aparecida - A campanha entra na negociação coletiva que é uma questão mais complexa e passa pela garantia de postos de trabalho. Nossa preocupação é fazer com que o trabalho seja realizado dentro das horas permitidas por lei e principalmente pelas horas que seu organismo agüente de forma saudável para que possa render de forma satisfatória e com qualidade.
Hora extra é precarização do trabalho e impede que tenha outra pessoa trabalhando. Melhorando a qualidade de vida o trabalhador adoece menos, portanto, se gasta menos com saúde e o governo não precisa investir tanto em saúde do ponto de vista curativo. Isso muda a relação do indivíduo com a sociedade, isso gera desenvolvimento para o país. Campanhas como as lutas pela 151, a 158 e a redução de jornada de trabalho trazem à tona temas como capital, produção, sociedade e um país em desenvolvimento sustentável onde o ser humano é o centro das discussões. Nós do ramo pensamos em saúde do ponto de vista da educação, prevenção e de políticas. Nosso olhar compreende a saúde como qualidade de vida.
Portal do Mundo do Trabalho: Como a CNTSS vê o corte da saúde no orçamento?
Maria Aparecida - A doença no país é visto como lucro é isso gera muitos problemas porque o investimento na saúde privada é priorizado. O que é um erro. A saúde é pública - o SUS (Sistema Único de Saúde), mas não é gratuita. O sistema é pago por todos nós, portanto esse dinheiro tem que ser revertido em políticas de saúde. A política pública de saúde é a política mais avançada que a gente tem pois permite a participação da sociedade, dos trabalhadores em todos os processos que vão desde sua elaboração, implantação e fiscalização. Se a sociedade brasileira utilizasse mais o Sistema Único a ponto de cobrar mais do governo, o corte na saúde não ocorreria.
Não existe plano privado no Brasil que garanta o atendimento do jeito abrangente que é o do SUS. Tanto que no atual governo federal os planos de saúde foram obrigados a incluir determinados atendimentos que até então não assumiam. Os atendimentos caros eram repassados para o SUS. Os que não tinham alto custo eram dos planos de saúde. Se você passa mal ou tem um acidente no meio da rua quem socorre é o SUS e somente depois o individuo é encaminhado ao seu plano privado. Só que esses primeiros atendimentos o plano não ressarce. Isso sem falar em determinados exames que são repassados ao SUS.
Precisamos valorizar o serviço público e exigir que cada vez mais os governos invistam na saúde. Quando falamos em sistema não estamos nos referindo só ao Ministério da Saúde. É também da Previdência, do Trabalho, da Agricultura e da Educação porque é um sistema que pensa saúde como qualidade de vida, que pensa o país em desenvolvimento. Temos que pensar como dar conta disso na área urbana e rural. Estamos falando de uma questão muita ampla e temos que garantir que o dinheiro seja aplicado na ação curativa e não na preventiva.
Portal do Mundo do Trabalho: Quais os problemas enfrentados pelo serviço público?
Maria Aparecida - Nós do serviço público, há anos, travamos uma luta de redução de jornada para 30 horas (determinação Organização Mundial de Saúde) tendo em vista as particularidades da função que, pode não parecer, mas é muito estressante por lidar com fragilidade do ser humano. Existe uma pesquisa que identifica a depressão como uma das principais doenças da categoria. O serviço público sofre com a diminuição de contratação de funcionários e os que estão em atividade estão se aposentado e não há previsão de abertura de concursos públicos.