Considere-se uma pessoa de sorte caso você nunca tenha sido surpreendido pela lombalgia, a desagradável e popular dor nas costas. O problema, de acordo com especialistas, é a segunda maior causa de consultas médicas no país, ficando atrás apenas da cefaleia (dor de cabeça). Nos países desenvolvidos e no Brasil, o mal se impõe como o principal motivo de incapacidade para o trabalho e compromete a qualidade de vida de grande parte da população.
O neurocirurgião Luís Claudio Modesto(Brasília) assegura que a lombalgia faz parte da vida do ser humano. Mais de 80% das pessoas com 60 anos ou mais sofrem com o problema. Na faixa etária dos 40, a incidência é de 40%. O médico observa que cada sociedade encara a síndrome de uma forma. Em tribos africanas, o indivíduo só pode fazer parte do conselho de anciões se tiver lombalgia. “Nas décadas de 1980 e 1990, a Inglaterra passou por problemas econômicos em decorrência do grande número de afastamentos e aposentadorias precoces provocados por dores lombares. Já na Arábia Saudida, ter lombalgia faz parte de estar vivo. Eles jamais deixam de trabalhar por conta dessa manifestação”, aponta.
A dor na região lombar pode se apresentar de duas formas. Na aguda, é ocasional, de moderada a intensa e dura cerca de duas semanas. Na crônica, o incômodo atinge a vítima com frequência, sendo quase diário. Estudos sugerem que cerca de 90% dos pacientes desenvolvem o mal por conta do uso excessivo das estruturas dorsais. A dor é resultante de entorses e distensões, de deformidades da estrutura anatômica ou de acidentes. “Os outros 10% dos adultos apresentam dorsalgia por causa de doenças degenerativas, inflamatórias, infecciosas ou tumorais. É importante levantar os fatores que levam à dor e analisar a percepção e relato dessa sensação pelo paciente, além do grau de disfunção e incapacidade”, explica o médico fisiatra Moacir Silva Neto.[]
Barrigas e abusos
A lombalgia também pode ser causada por esforços repetitivos, condicionamento físico inadequado e erros posturais. Profissionais que passam muito tempo sentados, como costureiras e motoristas, correm mais risco de serem acometidos pelo problema ainda jovens. Os sedentários, principalmente aqueles com gordura na região abdominal, a famosa barriga, são sérios candidatos. “A dor lombar aguda é conhecida entre os médicos como lombago, e pode ser terrível. Em seu auge, a pessoa chega a sentir dormência, fraqueza nas pernas e crises de ansiedade”, observa Modesto. O estresse psíquico também detona crises. “Quem está instável emocionalmente fica predisposto a sentir dor. O estilo de vida tem sido um agravante.
A população está cada dia mais sedentária e isso contribui para que a musculatura e os ossos fiquem fracos. A região lombar sente os abusos”, completa Moacir.
A técnica em enfermagem Mary Jones Bispo, 43 anos, sentia dores eventuais nas costas desde 2007. “Há dois meses, tive uma torção no pé que acabou detonando a lombalgia. Exames comprovaram um desgaste na região lombar. Hoje, não consigo ficar muito tempo na mesma posição e já levanto sentindo dor”, relata. O problema a deixou afastada do trabalho por mais de 40 dias. “A dor comprometeu totalmente minha vida. Carrego pacientes, empurro macas, cadeiras de rodas… São atividades inerentes à minha profissão. Agora, não posso mais pegar peso, não tenho conseguido dirigir e nem fazer nada em casa. Cheguei a ficar depressiva, pois a dor não é algo palpável. Muitas pessoas duvidam que você a sente”, lamenta.
Chances
O tratamento é um desafio para os médicos. Não existe apenas uma linha a ser seguida para todos. Algumas terapias trazem bons resultados para alguns e nenhum efeito para outros. “Uns melhoram com o fortalecimento da musculatura do tronco, outros com alongamento e mobilização ou com exercícios que revigoram o abdômen. Em muitos casos, observa-se a melhora com séries de flexão e extensão, e existem aqueles que readquirem qualidade de vida dando enfoque à questão emocional e à postura. Não há regras”, esclarece o fisiatra Moacir.
O tratamento visa ao alívio do sofrimento, à funcionalidade e à qualidade de vida. O neurocirurgião Luís Cláudio Modesto alerta que é preciso cautela. Ele recomenda que o paciente comece pelas técnicas de reabilitação, partindo para medicamentos, acupuntura e bloqueios anestésicos se não conseguir o alívio da dor. Caso tudo isso não funcione, ainda pode-se tentar medicações a base de opiáceos e intervenções cirúrgicas nas raízes lombares, vias nervosas e medula. “Somente em casos extremos, quando nada funciona e há uma associação da dor com anormalidade na coluna, é que se deve partir para a cirurgia nessa estrutura. Infelizmente, no Brasil, o paciente com dor lombar procura primeiramente o cirurgião de coluna. A cirurgia é feita, mas a dor nem sempre é aliviada”, pondera.