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O PSDB e o fim do modelo político da Nova República

13/07/2011

Escrito por: Blog Luiz Nassif

O PSDB e o fim do modelo político da Nova República Debate sobre a perda do discurso do partido recebeu comentários diversos no blog, mas definições concretas sobre novos rumos ainda estão longe da realidade.

Por Luis Nassif

Ontem houve bela discussão no Blog sobre os rumos do PSDB. Primeiro, o artigo do Renato Janine publicado em no Valor, sobre a perda do discurso, que suscitou comentários ricos e variados. Depois, o rebate de Jotavê, tentando definir novas bandeiras para o PSDB.

Em síntese, Jotavê propõe que o PSDB coloque em prática as bandeiras sociais-democratas assumidas pelos governos Lula e Dilma, mas sem o corporativismo que enxerga no PT. É muito pouco para definir um programa de partido.

O que propõe, em suma, é um partido social-democrata sem sindicatos, algo inédito.

Como muitos intelectuais de centro-esquerda, Jotavê é órfão de um PSDB que não aconteceu.

Antes de chegar ao poder, com FHC, o PSDB congregou um grupo de intelectuais, cientistas políticos, jornalistas, que tinham em comum a ideia vaga de uma social democracia inclusiva, com preocupações modernizadoras e sociais, fugindo tanto dos cânones da esquerda tradicional (PCB) quanto da militância exacerbada do PT que emergiu das lutas dos anos 80.

Esse PSDB foi sepultado quando a linha ideológica do partido passou a ser definida pelos financistas, os economistas que fizeram o Plano Real. É neles que FHC vai se basear para desenhar seu governo.

Jotavê supõe que os economistas estavam tão atarefados buscando a estabilização que não tiveram tempo de colocar em prática suas preocupações sociais.

Sinto desapontá-lo, mas essas temas nunca fizeram parte de suas preocupações. É só conferir o discurso atual da "Casa das Garças" e as manifestações esparsas dos principais formuladores do Real. São discursos de guerra, em favor do financismo mais desbragado.

Como detalhei em meu livro "Os Cabeças de Planilha", todo o desenho da remonetização do Real, com apreciação do câmbio - a decisão que criou uma dívida interna imobilizadora, provocou quebradeira generalizada na economia, aprofundou a cartelização do país - não foi um mero acidente, provocado por excesso de cuidados com a inflação. Foi uma estratégia política de tomada do poder através dos novos grupos financeiros que se instalavam.

A estratégia era clara. Supunha que o PT tivesse o domínio da máquina pública. O PSDB passaria a controlar o mercado, através de aliados criados no processo de privatização e nas jogadas de política monetária e de manipulação da dívida externa.

Não se trata de novidade mundial. Historicamente, sempre aconteceu esse conflito Estado x Mercado. O controle do Estado é provisório - a não ser em regimes ditatoriais. Já o controle do mercado é permanente.

A possibilidade de controlar a política através de novos grupos econômico-financeiros já havia sido colocada em prática pelo Visconde de Ouro Preto, último Ministro da Fazenda da Monarquia, e por Rui Barbosa, primeiro Ministro da Fazenda da República.

Um dos grandes especialistas no Encilhamento (o desastre econômico produzido pela estratégia de Rui Barbosa) foi justamente Gustavo Franco, o principal e mais brilhante ideólogo do Real. E a lógica do Real obedeceu a essa estratégia política, ainda que à custa de sacrificar 12 anos de crescimento brasileiro.

A face mais ostensiva desse pacto é Daniel Dantas.

A paternidade das políticas sociais

O "se" é perigoso na análise histórica. Mas se algum "se" pudesse ter mudado a trajetória antissocial do PSDB, teria sido Covas, não fosse sua morte prematura, jamais os financistas do Real - muito mais empenhados em um jogo de poder e de enriquecimento pessoal.

Ao longo dos dois governos de FHC, o PSDB perdeu totalmente as características socialdemocratas. Não entendeu os novos tempos, manteve-se fechado a qualquer demanda da sociedade civil, que aflorava após a redemocratização.

Foram ensaiadas algumas políticas sociais, especialmente sob dona Ruth, sem jamais terem sido prioridade ou ganhado escala. É ridículo ouvir Serra todo dia querendo se apossar da paternidade de políticas sociais, porque a ideia A ou B foi anterior ao Bolsa Família. Ora, em seu governo Sarney instituiu o Vale-Leite. Depois, houve o Vale Gás e outras formas de políticas assistenciais. O grande feito foi justamente o da massificação das políticas sociais, o fato de terem sido colocadas no centro das políticas públicas.

E esse bonde o PSDB perdeu. Assim como qualquer sensibilidade para governos participativos ou de cunho social.

Como governador de São Paulo, tendo todo o aparato midiático para divulgar cada espirro, qual a política social inovadora implementada por Serra, qual o fórum de debates que abriu para ouvir a sociedade civil, trabalhadores, empresários, organizações sociais? Nenhum. Por que não massificou as ideias de dona Ruth e outras surgidas nos anos 90? Porque ter ideias, até eu tenho. O feito político que conta é colocá-las em prática.

Ora, um partido é um conjunto de princípios mas que, para consolidar-se, dependem fundamentalmente de resultados práticos que constituem a sua história. Como passar uma borracha nas políticas de FHC, da inação de Serra governador de São Paulo?

A privatização como fim

Outras das bandeiras iniciais do PSDB, a ideia de que a privatização seria apenas uma etapa de uma estratégia de tornar o país mais competitivo, foi por água abaixo. A ideia de que seria possível compatibilizar pragmaticamente empresas privadas, empresas públicas atuando em ambiente de mercado, foi completamente abandonada no Brasil de FHC e em São Paulo de Serra e Alckmin.

É o que explica o fato de ter transformado a maior empresa de energia do país - a CESP - em um morto-vivo para ser privatizado, depois de seu valor ter praticamente virado pó. Ou vender a CTEEP (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica), empresa que seria essencial para integrar a geração de energia do bagaço das usinas paulistas. Ou vender a Nossa Caixa e, depois, criar uma agência de desenvolvimento para emprestar dinheiro - maluquice que só poderia caber na cabeça atrapalhada do neo-Serra.

Nada garante que o governo Dilma dará certo. Mas é evidente que a tomada do poder não pode depender exclusivamente dos erros dos adversários.

Sendo assim, que espaço restará ao PSDB? O de ser um PT sem sindicato? Claro que não. A bandeira social-democrata é dos governos Lula e Dilma e não haverá como arrancar de lá.

O combate ao aparelhamento do Estado poderia ser uma bandeira eficiente. Mas só enquanto se conseguir manter a blindagem sobre o aparelhamento de São Paulo. Recentemente o Estadão se permitiu uma matéria sobre o desmanche da TV Cultura onde se mancionavam salários altos pagos a funcionáriosn da Secretaria da Cultura, de Andrea Matarazzo. Não houve uma suite sequer para levantar o nome dos beneficiados.

Aliás, Jotavê, que é um crítico corajoso do corporativismo universitário, deveria circular por outras bandas do governo paulista, para ter uma ideia pálida do que é aparelhamento.

Partindo-se do pressuposto que o próprio avanço da Internet derrubará gradativamente todas as blindagens, não é por aí que o PSDB conseguirá sua legitimização.

O novo quadro político

As bandeiras disponíveis estão em campos jamais trilhados pelo partido. Talvez na defesa da desburocratização e do empreendedorismo - bandeira de Guilherme Afif Domingos. Mas é uma bandeira que só daqui a alguns anos baterá fundo no coração da atual geração de incluídos por programas sociais.

Há a bandeira da gestão, eficazmente utilizada em Minas Gerais, Pernambuco e Espírito Santo. Mas, se o governo Dilma não se perder no campo político, o modelo apresentado no primeiro mês de governo será imbatível.

De qualquer modo, tudo indica que se esgotou o modelo político pós-redemocratização, no qual PT e PSDB assumiram o protagonismo, sendo apoiados por partidos ônibus, como PFL-DEM e PMDB.

A nova oposição definitivamente não sairá do PSDB, já que esgotou o tempo político para tentar reescrever sua história.

Ainda não se sabe o quadro que virá pela frente. Certamente já começou a ser moldado agora. Mas só daqui a algum tempo se terá clareza sobre esse novo desenho.

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