A direção da Calçados Azaléia Nordeste fugiu da audiência pública convocada pelo Sindicato de Verdade de Itapetinga e Região, deixando sem explicação os sucessivos desmandos que vêm praticando contra seus trabalhadores, como a série de mutilações provocadas e onda de demissões por justa causa. Em entrevista ao Portal do Mundo do Trabalho, o dirigente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Vestuário (CNTV/CUT), José Carlos Guedes fez um breve relato do que viu e ouviu na audiência, acompanhada pela Superintendência do Ministério do Trabalho e pela Procuradoria do Ministério Público no Estado, representantes de prefeitos da região, parlamentares e mais de uma centena de operários da fábrica.
Fale um pouco sobre a onda de demissões por justa causa patrocinada pela Azaléia...
A audiência pública focou nesta questão das demissões por justa causa, que é pesadíssima e preocupante, pois a empresa demitiu 1.285 funcionários no ano passado e pelas projeções deve se superar neste ano. É um escândalo que causa profunda indignação, ainda mais quando comparamos os 30% de demitidos por justa causa na Azaléia com os 1,4%, que já é um índice alto, no país. O que pude observar pelos relatos é o tamanho do descaso, da falta de sensibilidade e de um mínimo de civilidade. Alegando que os operários não têm compromisso, uma das maiores empresas do país não consegue estabelecer relações humanas.
Um verdadeiro escárnio...
É uma situação revoltante. Apenas na unidade de Itapetinga trabalham cerca de 13 mil pessoas, e há muitas outras que prestam serviço nas demais cidades da região. O que pudemos perceber é que há uma pressão violenta da empresa não só sobre o executivo e o legislativo, mas sobre todos. Mesmo os médicos têm medo de fornecer atestados para os trabalhadores doentes pois já foram vítimas de represálias. È escandaloso e revoltante.
Na última sexta-feira (20), a Azaleia foi finalmente condenada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) pelo uso irregular da máquina Matriz Injetora de Acetato de Etil Vinil (EVA), responsável segundo a própria Justiça, por acidentes com a amputação de dedos, punhos, mãos e antebraço dos empregados.
Conforme a ação, a empresa teria alterado o ciclo de funcionamento da máquina para obter maior produtividade e, com essa alteração, ocorreram inúmeros acidentes graves, com todo tipo de mutilação. Tem muito tempo que a Justiça luta pela interdição desta máquina e só agora o TST conseguiu, pois a empresa vinha conseguindo protelar a decisão. Neste período, que foi longo, ocorreram inúmeros acidentes, que agora o Sindicato está levantando um a um para somar no processo contra a Azaléia. As ações coletivas se multiplicam porque todos buscam que se faça justiça, que a impunidade tenha fim.
Neste verdadeiro circo de horrores, o que mais te chamou a atenção neste dia?
Houve depoimentos de pais e mães que perderam seus filhos. Mulheres que estavam grávidas e foram obrigadas a desempenhar funções que não poderiam, sob ameaça de serem demitidas, num assédio moral violento e absurdo. Filhos cujos pais tinham câncer e não puderam acompanhá-los até o hospital, pois seriam mandados embora e muitos outros casos que dão bem a dimensão do descaso ali existente. Só para lembrar, foi nesta mesma unidade que foi registrada uma intoxicação em massa de trabalhadores, mais de mil que foram parar no hospital depois de terem bebido água contaminada que não poderia sequer regar plantas. A fala do companheiro Carlos André, presidente da Federação dos Trabalhadores do Vestuário da Bahia, foi bastante dura e esclarecedora sobre as mutilações de dedos, mãos e braços, de acidentes que acabaram matando operários.
Qual o próximo passo das entidades sindicais?
Além do Sindicato estar preparando uma nova audiência com foco exclusivo na questão dos acidentes de trabalho, documentando toda a denúncia, a CNTV e a CUT vão levar o caso até à Organização Internacional do Trabalho (OIT), pois é inadmissível que em pleno século 21 tenhamos empresários que se comportem desta maneira, fugindo das suas responsabilidades. O próprio uso e abuso da justa causa, que já é um expediente totalmente ultrapassado, em Itapetinga é elevado a proporções desumanas. Nós exigimos trabalho decente, condições dignas, respeito. Vamos ampliar a mobilização e a denúncia, para que o Brasil todo saiba os crimes que a Azaléia está cometendo na Bahia e que se faça justiça.