Mesmo com avanços em relação ao respeito à orientação sexual, a homossexualidade continua sendo tabu ou uma questão difícil para ser tocada em espaços como a escola. De acordo com professores ouvidos pela Rede Brasil Atual, a forma como os educadores lidam com os comportamentos homofóbicos dos alunos é determinante para evitar episódios de preconceito e violência.
Manifestações preconceituosas e de intolerância continuam a ocorrer com frequência, especialmente entre adolescentes. A dificuldade em debater o assunto em sala de aula levou o Ministério da Educação (MEC) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) a formularem um kit para instruir professores e alunos sobre sexualidade. Mas a iniciativa enfrenta sérias resistências para seguir adiante.
Apesar de a tiragem prevista inicialmente ser de apenas 6 mil exemplares - o país tem 51,5 milhões de estudantes em escolas públicas - a reação foi grande. A contracampanha incluiu parlamentares da bancada evangélica do Congresso Nacional e alcançou tal dimensão que a presidenta Dilma Rousseff decidiu intervir e deixar o material de lado.
Para a professora de escola pública de Suzano, município da região metropolitana de São Paulo, Andréia Calçada, a postura do professor e a forma de abordagem são as melhores ferramentas para a discussão do assunto em sala de aula. “A escola é um lugar onde a criança forma seu caráter, tem um papel decisivo na formação do aluno", destaca. Ela acredita que tratar em sala de aula que homossexualidade não é doença nem algo anormal favorece que a criança assimile a importância da tolerância com naturalidade. "A escola tem o dever de promover a diversidade no dia a dia, e não só quando alguma coisa acontece.”
A mestre em educação Elisabete Oliveira lembra que não é difícil encontrar professores que, por despreparo, protagonizam atitudes homofóbicas. Em outros casos, pode-se exagerar na dose na hora de tentar conter o preconceito. “Existem professores que lavam a boca do aluno com sabão como forma de punição, por alguma brincadeira ingênua. Mas como você vai saber se, com quatro ou cinco anos, a criança tem a orientação sexual definida?”
Em maio deste ano, a reação de uma professora na Bahia ganhou projeção nacional. A vice-diretora de uma unidade estadual suspendeu um aluno por dois dias por tê-lo visto mexendo no cabelo de outro menino. O gesto da criança foi entendido por ela como "indecência" e "ousadia". A vice-diretora recomendou ainda "atenção" à mãe do menino, que decidiu prestar queixa à Secretaria Estadual de Educação. O órgão decidiu exonerar a vice-diretora por considerar que a conduta foi inadequada.
NOVO MOMENTO
A decisão do Supremo Tribunal Federal de validar os direitos de casais homossexuais à união civil estável, em junho deste ano, e a retomada, no Congresso Nacional, da discussão do projeto de lei 122/2006, que prevê a criminalização de atos homofóbicos, acentuam a necessidade de levar o tema aos bancos escolares.
Na análise da professora Cecília Rolim, coordenadora de escola, o debate sobre a homossexualidade deveria ocorrer no início da adolescência. “Tudo tem a sua hora, onde uma criança de quatro, cinco anos vai entender isso? Existem assuntos que você pode falar a partir da maturidade do aluno. Com oito, nove anos ela pode já começar a compreender o assunto.”
Longe de representar "risco" de crianças se "transformarem" em homossexuais, como alega a bancada religiosa no Congresso, a discussão do tema nas escolas ajuda a refletir sobre tolerância. Para Elisabete Oliveira, a sociedade ainda é bastante preconceituosa com os homossexuais. Brincadeiras de mau gosto são frequentes, seja no cotidiano escolar da criança, seja em casa. “A nossa sociedade sempre foi diversa e plural, mas a maneira que você lida com essa diversidade vem mudando ao longo da história, iniciativas como a decisão do STF e a cartilha anti-homofobia, oriundas de movimentos sociais e do poder público devem perpetuar movimentos a favor da diversidade”.