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Quanto vale um lugar na fila do SUS?

23/09/2009

Escrito por: Fonte – Folha de São Paulo – 14.09.2009

•Maria Luiza Levi


O SISTEMA privado de saúde será o grande beneficiário se for ratificada a regra que permite a destinação de até 25% da capacidade de hospitais públicos administrados como organizações sociais de saúde para pacientes detentores de planos de saúde e particulares.

A mudança vem sendo defendida como um meio de "fazer justiça ao SUS", mas seu efeito prático será a ampliação da oferta de serviços de saúde ao setor privado a um baixo custo relativo, viabilizando sua expansão a partir de recursos públicos.

A primeira questão que se coloca é saber como o governo fará para garantir que os preços cobrados pelos atendimentos assegurem a remuneração dos custos.

O Estado pretende monitorar os contratos das entidades administradoras de hospitais públicos com as operadoras de planos de saúde? Terá acesso ao pacote total de serviços negociados, para compreender o papel que as unidades de saúde estaduais terão na negociação como um todo?

Além disso, mesmo na hipótese de que os custos correntes sejam cobertos, acabará havendo apropriação de subsídio público pelo sistema privado, seja porque os investimentos em edificações e equipamentos já terão sido inteiramente cobertos pelo governo estadual, seja porque o funcionamento das unidades de saúde já estará bancado a priori pelo Tesouro do Estado, que entrará cobrindo gastos de manutenção na medida inversa da demanda privada.

Nessas circunstâncias, a "demanda SUS" -integralmente financiada por recursos públicos- tende a trazer a patamares mínimos a ociosidade das unidades, reduzindo o custo relativo dos serviços a serem comercializados.

Esse novo cenário será especialmente benéfico para as entidades que administram hospitais, laboratórios e clínicas no modelo das OSS, uma vez que a grande maioria já atua no sistema privado de saúde, vendendo serviços próprios a planos ou particulares.

A possibilidade de comercializar vagas nas unidades públicas de saúde lhes dará ótimas condições para compor os pacotes de serviços a serem negociados com os planos, inclusive oferecendo tipos de atendimento não disponíveis em sua rede própria.

Por sua vez, o segmento dos planos poderá se expandir por meio da criação de linhas de produtos voltadas especificamente ao "nicho" de pacientes que utilizam o SUS.

De qualquer forma, é de indagar se, independentemente de beneficiar o sistema privado de saúde, o arranjo não seria vantajoso também para o sistema público caso os recursos arrecadados sejam reinvestidos na unidade de saúde, como argumentam os defensores da proposta.

A questão é que, como a capacidade física das unidades não é infinita, especialmente em relação a certos tipos de atendimento, toda vez que o Estado cobrar de um plano de saúde por determinado serviço, um paciente do SUS terá deixado de ser atendido para dar lugar àquele que se dispôs a pagar.

O governo irá "ganhar" com o fato de que terá que repassar menos recursos para a manutenção da unidade. Mas será este o papel do Estado na gestão do sistema público de saúde, ceder parte da capacidade de unidades próprias, construídas e equipadas com dinheiro de impostos, para comercialização pelo sistema privado, reduzindo a oferta de tratamento aos pacientes do SUS?

O fato é que, passados mais de dez anos da aprovação da lei das organizações sociais de saúde, o governo nem sequer conseguiu estabelecer uma sistemática adequada e consistente de regulação dos preços dos serviços de saúde contratados atualmente nas unidades de saúde do modelo OSS.

A fixação dos valores contratuais é refém das estruturas de custos individuais das unidades, pela simples razão de que a regulação de preços de serviços de saúde é uma atividade extremamente complexa, para a qual o Estado ainda está se estruturando.

É inaceitável que se queira vender à sociedade esse aprofundamento do modelo das OSS que, em nome do SUS, só fará fortalecer a posição do sistema privado na disputa pelos recursos que a sociedade se dispõe a destinar aos gastos com saúde.
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MARIA LUIZA LEVI , 43, economista, é mestre em economia pela Unicamp e doutora pelo Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP.


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